
É foda por que
São milhões de orgasmos
Pessoas gritando
Morrendo nascendo
Tudo está acontecendo
Agora
A cada letra que digito
Na tela nervosa
Rachada do celular
Agora
A cada dígito que roda
Na bolsa
Nas apostas
Na máquina registradora
Caça níquel
De cada bala perdida
Camisinha
Croissant
Cruzando os céus
Bilhões de gemidos
Estrelas que explodem
E depois a vida com suas esquinas
Encruzilhadas esquisitíssimas
Aquelas perguntas
Tudo
Agora
Ao mesmo tempo
Quantos tiros disparados?
Mensagens disparadas
Quantas bombas detonadas?
Agora
Milhões de pessoas
Que não param de trepar
Crianças sem mãe
Com mãe também
Ou mães
Sem pai nem comento
Pessoal tá nem aí
Mas as crianças estão
Chorando
Querendo mamar
Sugar algo de vida
Nessa esquina
Pós apocalíptica
Estranhíssima
Um letreiro neon
Até hoje o futuro
Tem um letreiro neon
Piscando frenético
Meio queimado
Aproveitando dessa luz
Uma mãe limpa a bunda da criança
No próprio joelho
Usa a espiga de milho
Que comeu no jantar
Pra limpar o coco na perna
Agora
Milhões dessas coisas
Que parecem bizarras e
Banais
Acontecem ao mesmo tempo
Eu cagando no banheiro
Você lendo
É como se estivéssemos
Sempre no mesmo lugar
Mas tem a vida
Esse caminho franzino
Entre o céu e o inferno
Ou o ar e o subsolo
Enfim
Qualquer coisa que você acredite
Porque
Agora
Tem um tanto de gente rezando
Abaixando a cabeça
O tambor comendo
E o medo
O gozo
A fé
Ainda bem que tem algo depois
Daquelas encruzilhadas
Esquisitíssimas
E daquelas perguntas
Ainda bem que alguém
Sabe responder
Tem alguém respondendo
Agora
Mas eu não escuto muito bem
Se falassem todos a mesma língua
E ao mesmo tempo
Agora
Eu escutaria
Não importa onde estivesse
No cu do mundo
Escuro
Imundo
Cu também é legal
Mas enfim
Eu escutaria a resposta
Mas é tudo um som
Indistinto
Esse ruído de fundo
No contrário do olho
Um montão de gente
Vendo
Agora
Qualquer coisa acontecer
No olho do cu
Na TV
Na tela de amoled
No relógio
Na laranja mecânica
Daquela encruzilhada
Cheia de perguntas
Que me perseguem
O que tem para comer?
O que você vai fazer
No final de semana?
Quanto sobrou do troco?
E eu não sei
O que dizer
Agora
Porque parece tudo banal
Mas é seríssimo
Os gritos de cada morte
Os gritos de cada gozo
Os gritos de cada choro
E a cigarra cantando alto
Até explodir
Em um verão incomum
Frio nos trópicos
Tanta gente com calor
Agora
O suor que escorre
Da parede da sauna
O sangue que escorre
Da menstruação
O samba
O sal
O semba
A cumbia
O tamborzão
Agora
Alguém que te chama
Que me chama
A encruzilhada
A esquina
A pergunta
Mas eu não escuto muito bem
Queria que fosse diferente
Mais devagar
Mas
Tudo está
Acontecendo
Agora
*Créditos da gravação: voz de Domingos Guimaraens e baixo de Ricardo Dias Gomes
It’s fucked up
There are millions of orgasms
People screaming
Dying being born
Everything’s happening
Now
With every letter I type
On my cellphone’s
Nervous cracked screen
Now
With every number that turns
In the stock market
In the bets
In the cash register
Slot machine
From every stray bullet
Condom
Croissant
Crossing the skies
Billions of moans
Stars that explode
And then life
With its odd street corners
Crossroads
Those questions
Everything
Now
At the same time
How many gunshots fired?
Messages fired off
How many bombs set off?
Now
Millions of people
Who won’t stop fucking
Kids with no mom
With a mom also
Or moms
With no dad not to mention
Nobody cares
But the kids are
Crying
Wanting to breastfeed
To suck some life
Into this strange post-apocalyptic
Street corner
A neon sign
Even today the future
Has a half burnt out
Neon sign
Flashing frenetically
Making the most of this light
A mom cleans her kid’s butt
On her own knee
Using the corncob
She ate for dinner
To clean the poop on her leg
Now
Millions of these things
That seem bizarre and
Banal
Happen at the same time
Me shitting in the bathroom
You reading
It’s as if we were
Always in the same place
But there’s life
This narrow path
Between heaven and hell
Or the air and the subsoil
Anyway
Whatever you believe
Because
Now
There’s quite a lot of people praying
Lowering their heads
Drums beating
And the fear
The orgasms
The faith
Thank goodness there’s something beyond
Those odd street corners
And those questions
Thank goodness somebody
Knows how to answer
There’s somebody answering
Now
But I can’t hear very well
If everybody spoke the same language
And at the same time
Now
I’d hear it
No matter where I was
Where the sun doesn’t shine
Dark
Dirty
It’s cool because
I know the sun’s gonna shine
In my backdoor someday
But anyway
I’d hear the answer
But it’s all one indistinct sound
This background noise
Opposite the hole
A bunch of people
Seeing
Now
Anything happen
In their asshole
On their TV
On their AMOLED screen
On their watch
In the clockwork orange
Of that crossroad
Full of questions
That haunt me
What is there to eat?
What are you going to do
On the weekend?
How much change is left over?
And I don’t know
What to say
Now
Because everything seems banal
But it’s serious
The screams from every death
The screams from every orgasm
The screams from every sob
And the cicada singing loudly
Until it explodes
In an uncommonly cold summer
In the tropics
So many people feeling hot
Now
The sweat that drips
From the wall of the sauna
The blood that flows
From the menstruation
The samba
The salt
The semba
The cumbia
The big drum
Now
Somebody calling you
Calling me
The crossroad
The street corner
The question
But I can’t hear very well
I wish it were different
Slower
But
Everything is
Happening
Now
**Translated from the Portuguese by Marco Alexandre de Oliveira
Domingos Guimaraens nasceu em 1979 no Rio de Janeiro. É poeta e artista visual, doutor em Literatura, Cultura e Contemporaneidade pela PUC-Rio. É organizador de eventos de poesia, artes visuais e artes integradas. De 2003 a 2006 foi um dos organizadores do CEP 20.000, Centro de Experimentação Poética, que existe no Rio desde 1990. Em 2018 publicou Agora também antes pelo selo Mega Mini da Editora 7letras. Em 2011 publicou Um épico, pela Cartoneira cArAtApA. Em 2008, juntamente com Os Sete Novos, lançou o livro Amoramérica. Em 2006 publicou A Gema do Sol também pela editora 7 Letras. Tem textos publicados em antologias de poesia como É agora como nunca (org. Adriana Calcanhoto), Garganta (editoura Azougue). Está incluído na antologia internacional En la outra orilla del silencio, poetas brasileños contemporáneos, publicada no México, pela Libera/Unam, em 2012. Desde 2008 trabalha com o coletivo OPAVIVARÁ! viajando e expondo com o grupo por todo Brasil e no exterior. www.opavivara.com.br ; www.ossetenovos.org