
Neste tempo escuro
Desafortunada é a morte e vou escrevendo
na parede o medo . A dor dos que estão presos
no casulo. Não respiro cristais e de boca aberta
dormem os sonhos. Vivos cuidamos dos vivos,
mas não cuido nem de mim neste refúgio
de fundas grutas. E o homem mastiga o homem.
E vem parir com a noite escuras ervas.
República, não ousas murmurar
o que no sótão armas, nem
conceber sequer em
tua concha, pérolas.
O que é mistério
à erudição engana.
E o que brota da chama
endurece a flor
das estrelas.
Como o espírito
entorpece a larva
da matéria.
E sentei quando
animado falavas
com os bem-te-vis.
E há neles fidalguia
da alma que não
cede e são perplexos.
O tempo sabe
o tempo e o fim
da escuridão
é amar.
(Poema inédito da “Epístola aos vivos e mortos”)
Carlos Nejar nasceu em Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Pertence à Academia Brasileira de Letras e foi eleito também para a Academia Brasileira de Filosofia. Autor de diversos livros de poesia, além de romances e ensaios, ele publicou, ao completar setenta anos, a reunião da maior parte de sua poética, Poesia Reunida: I. Amizade do mundo; II. A Idade da Eternidade (Editora Novo Século, São Paulo, 2009).