
traduções para o espanhol: Sergio Ernesto Ríos
1
estamos sempre perfurando o tempo
temos abismos que rasgam os antebraços
e uma cicatrização forjada na língua dos dias
criamos sempre os mesmos calabouços
e nenhuma procissão nos salva
nossa linguagem é picada pela desmemória
e nossa vigília é abastecida pelo erro
deus fala uma linguagem indecifrável
mas estamos sempre a traduzir
como poço, cavalo ou nós mesmos.
estamos siempre perforando el tiempo
tenemos abismos que rasgan los antebrazos
y una cicatrización forjada en la lengua de los días
creamos siempre los mismos calabozos
y ninguna procesión nos salva
nuestro lenguaje es picado por la desmemoria
y nuestra vigilia es abastecida por el error
dios habla un lenguaje indescifrable
pero estamos siempre traduciendo
como pozo, caballo o nosotros mismos.
2
você não vê mas há no deserto
uma poça em desequilíbrio, uma oração antiga, movediça
o grito de uma criança, o código preciso da invocação
a penumbra que reside nas distâncias
ter um deserto que não se fecha, enegrecer o calvário
a tíbia, a quentura de uma geografia,
os nomes que moram no abandono
ser a sua própria imigrante a promessa definitiva
a posterioridade falhada
guardar no colo o próprio apagamento.
no lo ves pero hay en el desierto
un charco en desequilibrio, una oración antigua, movediza
el grito de un niño, el código justo de la invocación
la penumbra que reside en las distancias
tener un desierto que no se cierra, ennegrecer el calvario
la tibia, la calentura de una geografía,
los nombres que moran en el abandono
ser su propia imigrante la promesa definitiva
la posteridad fallada
guardar en el regazo el propio borramiento.
3
as ancas duras o sexo se esfarelando
para onde vai a sua voz nessa neblina dura da cidade?
meu braço nitidamente fraturado no teu corpo
as pálpebras costuradas no inferno
minha virgindade aumentando a cada dano
nenhum homem me atravessa
há um deserto na sala como em meu corpo
estou emparelhada em algum continente
sou feito um deslize
uma água que tem em seu curso a própria negação.
las ancas duras el sexo desmoronándose
¿adónde va tu voz en esa neblina dura de la ciudad?
mi brazo nítidamente fracturado en tu cuerpo
los párpados cosidos en el infierno
mi virginidad aumentando a cada daño
ningún hombre me atraviesa
hay un desierto en la sala como en mi cuerpo
estoy emparejada en algún continente
me sobra un desliz
un agua que tiene en su curso la propia negación.
4
já nasci em ruínas
a língua da mãe me premeditou
estranhei desde cedo o leite materno
sou uma falha
um cordão umbilical apodrecido no ventre
uma imagem que não se completa.
ya nací en ruinas
la lengua de madre me planificó
extrañé desde temprano la leche materna
soy una falla
un cordón umbilical podrido en el vientre
una imagen que no se completa
5
não precisaria mais ser terrena
mas ainda preciso de armas, espelho e braços
preciso da violação
me fiz planta água
animal extinto a própria extinção
a imagem que margeia o silêncio
preciso dos átrios antigos das moradas
e a ranhura daquilo que não se cala
-o ventre em declínio da mãe
nos diz sobre a escuridão que avança-
tenho a face devorada pela infância
essa que é nossa primeira violação
o rosto cortado por dois idiomas.
6
plantar no antebraço
a noite vascular que mora nos seixos
a torção da água que vi em seu rosto
a veia inflamada do esquecimento
-essa cerimônia anônima e distendida-
quero falar às sombras sobre a raiz que transpira
mas minha boca escorre sobre uma grande queimadura
arcaicamente, exercitar o plantio de cura sobre os abandonos
ferir a invenção dos territórios, o homem e seu acúmulo
o terror da coisa ausente, o fogo selvagem
o caminho forjado que se deita na voz
7
habitar diferente a própria saliva- ser flor carnívora na tua voz
não negar a travessia, não esquartejar o sintoma, talvez cegá-lo
sou uma silenciosa, trago a ancestralidade de um pequeno tumor
estou sempre em expedição
persigo a duração da casa através de sua fuligem
o manuscrito que envolve o seu músculo
meu corpo enquanto fachada
a grande sombra erguida sobre a palavra migração.
8
A expedição de um Rosto
um idioma que não vinga
a origem desabitada
toda imagem é tomada pelo Oco
um incêndio infinito
um animal longo dobrado no mistério
*
é sempre de um magma anterior que falo
eu, que também sou o método de uma imagem que corrói
Raquel Gaio es poeta y artista visual. Escribió los libros manchar a memória do fogo (Uratau, 2019) y das chagas que você não consegue deter ou a manada de rinocerontes que te atravessam pela manhã (Editora Patuá, 2018). Desarrolla trabajos entre la fotografía, performance e objeto para dialogar con la esfera de lo íntimo, la memoria y la fragilidad.